Intitulado Uma Visão dentro de Escolas ‘Primárias’ (até a quarta série do ensino fundamental, no caso do Brasil), o relatório apresenta os resultados de uma pesquisa realizada em 11 países na América Latina, Ásia e Norte da África*. Como parte do programa de Indicadores da Educação Mundial (WEI), os países se envolveram no desenvolvimento e na realização da pesquisa a fim de examinar os fatores que formam a qualidade e a igualdade da educação primária.
Professores da quarta série e diretores de mais de 7.600 escolas responderam questionários detalhados sobre como as escolas funcionam, como os professores ministram as aulas, as condições de aprendizagem e o apoio disponível aos professores e diretores. Os dados foram coletados e analisados entre 2005 e 2007.
“Essa pesquisa oferece uma riqueza de dados considerável. Por um lado, vemos como faltam recursos básicos nas escolas – água encanada ou eletricidade – que são oferecidos normalmente nos países desenvolvidos”, diz Hendrik van der Pol, diretor do Instituto. “Mas os dados também revelam como a desigualdade social afeta a oportunidade de uma criança aprender. Claramente, nenhum país – rico ou pobre – está imune a essas disparidades.”
O relatório revela grandes lacunas em recursos entre escolas rurais e urbanas. Na Índia, 27% das escolas em vilarejos possuem eletricidade, comparado com 76% das escolas em pequenas ou grandes cidades. Somente cerca de metade dessas escolas rurais possui toaletes suficientes para meninas e menos de 4% possuem um telefone.
No Peru, menos da metade das escolas da área rural está equipada com eletricidade, biblioteca ou toaletes para meninos ou meninas. Já em áreas urbanas, quase todas as escolas possuem eletricidade, 65% possuem toaletes suficientes e 74%, bibliotecas.
Em geral, a estruturas de escolas em vilarejos apresentam uma necessidade maior de reparo, de acordo com os resultados da pesquisa. No Peru e nas Filipinas, por exemplo, diretores nas áreas rurais relatam que aproximadamente 70% dos seus alunos freqüentam escolas que necessitam de grandes reformas ou de uma reconstrução completa. No Brasil, metade dos alunos em áreas rurais freqüenta salas de aula deterioradas, comparado com menos de 30% dos alunos em estabelecimentos urbanos.
“É perturbante pensar que alunos recebem mais ou menos recursos de acordo com o lugar em que vivem. Mas isso é só uma parte da estória,” diz Yanhong Zhang, um dos autores do relatório. “O estudo mostra que alunos em vilarejos possuem maior probabilidade de serem oriundos de lares desprivilegiados. Então, as desigualdades em recursos escolares estão vinculadas a seus status sócio-econômicos. Na verdade, essas crianças estão sujeitas a uma dupla desvantagem – a carência de recursos em casa e na escola.”
Na pesquisa, professores e diretores de escolas foram solicitados a avaliar os históricos dos seus alunos, baseando-se em uma série de indicadores: da renda familiar e nível de educação dos pais à freqüência com a qual essas crianças pulavam refeições. As informações serviram como base para um índice usado para examinar os vínculos entre o status sócio-econômico e as condições escolares, incluindo o ambiente de aprendizagem.
Um dos fatores mais importantes que formam os ambientes de aprendizagem é o envolvimento dos professores e alunos. De acordo com o estudo, professores e diretores que trabalham em escolas que atendem crianças em situação de desvantagem social costumam relatar níveis mais baixos de motivação de alunos, como também mais problemas comportamentais. Esse achado foi mais marcante em países da América Latina e na comparação entre escolas públicas e privadas.
Tais resultados do estudo são baseados em percepções subjetivas e, por conseguinte, devem ser interpretados com cautela. As crianças em situação de desvantagem são, de fato, estudantes menos motivados? Ou as difíceis condições de trabalho dos professores influem no olhar que eles têm dos alunos? Para os autores do estudo, a situação é preocupante nos dois casos. Percepções negativas podem levar a um círculo vicioso nos quais professores, pais e estudantes esperam e tiram menos proveito da escola.
O estudo aborda como esse espiral de expectativas reduzidas pode influenciar o ambiente de ensino e a aprendizagem. Ele oferece informações detalhadas sobre diferentes questões: do grau de empenho das escolas para conseguir que seus alunos desenvolvam ao máximo seu potencial escolar ao interesse dos pais pelos estudos de seus filhos.
Os dados indicam que as condições de trabalho são consideradas mais difíceis em escolas que recebem um número maior de estudantes desfavorecidos. Nelas, os professores se encontravam mais insatisfeitos com o salário, com o apoio prestado pelos pais, com o tamanho das turmas e com o acesso a material escolar.
A pesquisa também incluiu um questionário específico para avaliar em que medida são oferecidas aos estudantes oportunidades reais para o aprendizado da leitura. Na maioria dos países, professores com estudantes motivados e pertencentes a classes sociais favorecidas tendem a fazer uso de materiais e atividades mais inovadoras, assim como de métodos de ensino mais criativos. Por outro lado, professores com estudantes de menor renda descrevem seus estilos de ensino como menos exigentes e mais freqüentemente baseados na memorização, por repetição.
Segundo os autores, há uma necessidade urgente de destinação de mais recursos às escolas presentes em comunidades menos privilegiadas. Reformas em estruturas ou bibliotecas, entretanto, não asseguram que todas as crianças atinjam seu potencial escolar. São necessárias políticas direcionadas para melhorar o ambiente de aprendizado de crianças e as condições de trabalho de professores e diretores. A desigualdade envolve uma série de problemas que afetam a sociedade de forma abrangente. Com apoio adequado, porém, as escolas podem oferecer mais oportunidades a seus estudantes.
* Argentina, Brasil, Chile, Índia, Malásia, Paraguai, Peru, Filipinas, Sri Lanka, Tunísia e Uruguai.
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