Técnica de preparo prévio, adotada em faculdades, facilita envolvimento dos estudantes
Renata Cafardo
Acabou aquela história de que professor ensina e aluno aprende. Algumas escolas particulares têm rompido essa lógica que parece óbvia, mas hoje é tida como tradicional e ultrapassada porque não combina com o mundo atual, em que as informações estão disponíveis para quem quiser. Elas passaram a exigir que os alunos cheguem preparados para as aulas, com leitura prévia dos capítulos dos livros, pesquisas sobre o assunto, buscas na internet.
"As aulas se tornam mais dialogadas e o professor também precisa estar preparado para essa mudança", diz a assessora pedagógica do Colégio Rio Branco, Vilma Rocha, que instituiu o que foi chamado na escola de "ensino estruturado" no ano passado. Ela conta que as aulas agora sempre começam ancoradas no conhecimento prévio do aluno, pesquisado em casa. Só depois o professor complementa as discussões com mais informações. "O aluno deixa de ser um elemento passivo."
"O estudante precisa se preparar para aprender sozinho porque no trabalho e na faculdade será assim", diz Walkiria Ribeiro, diretora-geral do Colégio Vértice, tido como o melhor de São Paulo há três anos por causa de sua posição no ranking do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Seus alunos, desde a 1ª série, são estimulados a preparar-se previamente para as aulas, lendo o conteúdo que será visto no livro didático e trazendo pesquisas de casa.
Ela conta que pede aos pais para não ajudarem os filhos nesse tipo de atividade nem em lições de casa. No primeiro mês do ano letivo, os estudantes aprendem a fazer a leitura prévia, selecionar dúvidas, levantar vocabulário desconhecido e preparar-se para a discussão em classe. E isso não acontece só em aulas de história ou geografia, cujos assuntos podem ser mais facilmente relacionados com temas atuais. É preciso ler e pesquisar também sobre logaritmos, química, física.
PARADIGMA
Para a educadora da Universidade de São Paulo (USP) Silvia Colello, esse tipo de estratégia é salutar e segue tendências atuais. "Hoje o conhecimento está disponível e aprende aquele que sabe procurar o que precisa." Mas ela lembra que o professor precisa estar preparado para lidar com o imprevisível, já que os alunos trarão todo tipo de informação sobre o tema.
"Os pais também precisam entender essa proposta e não achar que o professor está deixando de fazer o seu papel", completa. "Essa estratégia pressupõe a multiplicação de vozes na sala de aula e isso muda os paradigmas da escola."
Gustavo Freitas Mancilha, de 16 anos, que estuda no 2º ano do ensino médio no Rio Branco, diz que no começo foi difícil se acostumar com a maior carga de trabalho em casa. "Mas depois se torna um hábito. Você acaba descobrindo assuntos que gosta." A colega Nicole Goldman, de 15 anos, conta que nem todos os alunos têm disposição para fazer leituras prévias, pesquisas. "Fica claro que quem se prepara se sai melhor depois."
O costume de pedir leituras e pesquisas antecipadas é comum em universidades, pois se imaginava que os alunos estariam mais maduros para se deparar com um tema novo antes da intervenção do professor. "Há uma tendência contemporânea de se antecipar a pesquisa. Antes se imaginava que primeiro se aprende e depois se faz pesquisa. Agora, isso acontece junto", explica Silvia.
Na Escola Castanheiras, que atende crianças apenas do ensino fundamental, a estratégia não é sistemática, mas aparece sempre que os professores percebem que alunos podem contribuir com a busca de conteúdos. "É importante instrumentalizar a criança para aprender a pesquisar. Hoje, nem os pais nem a escola conseguem dar conta de todo o conteúdo que ela precisa aprender", diz a coordenadora pedagógica, Rosana De Pieri. Ela conta, porém, que muitas vezes prefere que se pesquise em computadores e na biblioteca da própria escola para evitar a ajuda dos pais.
Em algumas escolas, a mudança é iniciativa de poucos professores. No Colégio Santo Américo, o professor de ciências Cesar Pazinatto pede aos alunos que tragam principalmente reportagens sobre temas que serão discutidos. "Isso facilita a aula porque os alunos participam mais", conta. No Colégio Santa Maria, a aula de geopolítica deixou de ser uma aula, diz a professora Adriana Freitas. "São só oficinas de debates com os conteúdos trazidos pelos alunos."
ESTRATÉGIA
Aviso prévio: Professores avisam aos alunos qual assunto será discutido na próxima aula
Orientação: Os professores indicam aos estudantes os capítulos de livros a serem lidos e sites na internet com informações. Também pedem que os alunos busquem reportagens de jornal
Preparo: Os alunos lêem e pesquisam em casa ou mesmo na própria escola antes da aula
Participação: A aula começa com a participação dos alunos, que contam o que pesquisaram, posicionam-se sobre o tema e trocam informações
Monitoramento: O professor participa organizando o debate, esclarecendo dúvidas e acrescentando conteúdos
Estadão
28 de abril de 2.008
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