Unidades com desempenho ruim no Saresp também estão em área de vulnerabilidade social
Simone Iwasso e Maria Rehder
Tirando a região central de São Paulo, 38 das 50 escolas estaduais da capital com maior número de faltas de professores justificadas com atestados de consultas médicas estão localizadas em áreas consideradas de vulnerabilidade social pelo governo, representando 76% das unidades. Essas são também as escolas onde os alunos tiveram os mais baixos desempenhos no Saresp, a avaliação aplicada pela Secretaria de Estado da Educação para aferir conhecimentos em matemática e língua portuguesa.
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A conclusão aparece no cruzamento da lista de faltas dos professores por escola, obtida com exclusividade pelo Estado, com as notas do Saresp, disponíveis no site da secretaria, e a relação das escolas em áreas vulneráveis, onde o professor recebe um adicional salarial. A classificação de vulnerabilidade é feita pelo governo com base em índices de criminalidade, expectativa de vida, analfabetismo, mortalidade materna e renda familiar, por exemplo.
As faltas com atestados poderiam acontecer dia sim dia não, somando 15 em um mês, sem prejuízo salarial para o docente. Lei sancionada na semana passada pelo governador José Serra (PSDB) restringiu a seis por ano o limite dessas faltas.
Pela comparação entre as três listas, o cenário é pior nas zonas sul e leste. As cinco escolas com mais faltas em cada uma das sete diretorias de ensino estão em locais de vulnerabilidade e tiveram pontuações no Saresp abaixo da média das escolas próximas. São unidades que unem os principais problemas enfrentados pelo ensino público.
Uma das piores é a Escola Estadual Washington Alves Natel, no Grajaú, com 330 faltas de professores no ano passado. Com cerca de 2.500 estudantes de ensino médio e fundamental, sua pontuação no Saresp para alunos da 8ª série foi de 229 e 217 pontos em português e matemática, respectivamente, 8 pontos abaixo da nota da região.
Também na zona sul, a Escola Estadual Thiago Alberione tem 2,4 mil alunos e 100 docentes - que faltaram 292 vezes no ano passado. "Há muitos afastamentos e isso prejudica os alunos", diz o diretor Nivaldo Batista da Silva. "Até tínhamos professores substitutos, mas eles não conseguiam dar continuidade ao assunto por serem de outra área", comenta. Este ano, uma norma da secretaria proibiu que o substituto seja de qualquer área, como costumava acontecer, tendo de ser da mesma disciplina para a qual irá lecionar.
Já na Escola Estadual João XXIII, na zona oeste, o diretor Maximino Zanferrari reconhece que as faltas não estão ligadas a questões de saúde. "Tivemos uns três professores que, se tiveram seis presenças no mês, foi muito. A gente chegou a comentar que não sabe se é por descontentamento ou porque os colégios particulares pagam mais", conta. Outro problema no local é a rotatividade. "A escola está em um lugar muito pobre de periferia. Sofremos depredação, que só melhorou depois que fizemos uma parceria com uma empresa privada para tentarmos melhorar o ensino."
Em dois meses, André Emmerick Solyom, de 15 anos, aluno da Escola Estadual Prof. Paulo Novaes de Carvalho, na zona leste, teve cinco aulas vagas e perdeu a conta de quantas com substituto. "Os professores faltam, mas a culpa não é deles. A culpa da má qualidade da educação é do Estado, que paga baixos salários, e dos alunos, que são desinteressados", diz ele, que ganhou o posto de vereador-mirim na Câmara Municipal de São Paulo.
FATORES
Para a professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Marina Graziela Feldmann, o excesso de ausências é um dos componentes que levaram os alunos a não terem bom desempenho no Saresp, mas é preciso ser entendido dentro de um contexto maior, onde aparecem escolas problemáticas, sem projetos e que não fazem com que o professor se comprometa.
"O professor não pode ser culpabilizado. É preciso levar em conta a política de remuneração, se ele é capacitado continuamente, se tem de dar aulas em outras escolas", diz. A educadora, no entanto, avalia como positivas as medidas adotadas pela secretaria. "Elas mostram que é possível ter um certo planejamento na rede."
O presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Carlos Ramiro de Castro, reconhece que a falta do docente tem impacto no aprendizado do aluno, mas ressalta que não se pode apenas levar em conta um fator para avaliar a qualidade da educação. "É lógico que é importante ter o professor em sala de aula, mas é preciso levar em conta as condições de trabalho que são oferecidas, a falta de infra-estrutura das escolas. É muito fácil culpar os professores pela má qualidade do ensino."
Estadão
22 de abril de 2.008
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