MARIA REHDER, maria.rehder@grupoestado.com.br
Mais um ano começa e o ensino público no Brasil ainda continua fraco. E o mais grave: falta reflexão - por parte da sociedade - sobre os princípios morais da escola e, principalmente, dos atores nela inseridos. Essa avaliação é de Yves de La Taille, especialista em psicologia moral da USP, que, em entrevista exclusiva ao JT, aponta possíveis caminhos para a melhoria da Educação básica do País.
JT: A escola pública brasileira é uma instituição justa?
Yves: As instituições são justas do ponto de vista das normas que elas regem. A escola pública tem de ser uma instituição justa, pois todo cidadão tem o direito a ela. O problema é que para que uma instituição seja de fato justa, é preciso que os representantes humanos desta instituição sejam morais. Por exemplo, professores que faltam o tempo todo acabam transformando a escola em uma instituição injusta.
Então a culpa da má qualidade do ensino público é do Estado ou do professor?
Primeiro, a escola pública é uma instituição do Estado. Se este estipula uma regra que autoriza o professor a faltar e que implica prejuízo claro para o aluno, então a lei por si só é injusta. No entanto, mesmo com as leis mais justas, é preciso que os seres humanos tenham uma atitude justa, respeitosa. Se o professor decide faltar o número máximo estipulado pelo Estado, ele mostra que não entendeu nada sobre o princípio da lei - que consiste em dar uma liberdade de faltas para casos de extrema necessidade. Então, este profissional acaba aplicando a regra e não o princípio da lei. Na verdade, uma pessoa moral apreende os princípios e não apenas as regras. Mas, por outro lado, reconheço que a profissão do professor é cansativa, principalmente para aqueles de escolas públicas que têm de acumular cargos para conseguir salário digno.
O que é ser uma pessoa moral?
A moral situa-se no campo do dever e refere-se à pergunta “como devo agir?”. A moral não depende de nada biológico. Todo ser humano nasce com uma tendência para a relação com seu semelhante. Se essa relação será violenta ou baseada na justiça, não é possível saber, pois isso não está programado. Então a moral é algo que se aprende.
E qual é o papel da escola na formação de um cidadão moral?
A moral está totalmente relacionada à área da Educação. O ser humano começa a desenvolver sua moral por volta dos quatro anos de idade, então, agentes externos - família e escola - são responsáveis pela formação da moral dessa criança. Mas o problema é que não há nada que obrigue o professor a levantar a discussão sobre moral e ética com os alunos, ou até mesmo com colegas de trabalho.
Mas a ética não é um eixo transversal proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)?
Os PCNs, que foram publicados há dez anos, propõem que a ética seja trabalhada de forma transversal, em equipe, o que significa que todos os professores são responsáveis pelo trabalho desta temática com seus alunos. Mas como é transversal, fica claro que isso não é atribuição de apenas um professor. O problema é que na prática geralmente vemos determinados professores fazendo trabalho brilhante com os eixos transversais, mas de forma isolada, sem a participação integrada dos demais professores, o que acaba traindo a própria idéia de transversalidade.
Então, o que fazer para que a escola pública ofereça ensino de qualidade e contribua de fato para a formação de cidadãos morais ?
Na constituição brasileira a Educação está claramente vinculada à formação de cidadania. A formação do cidadão passa necessariamente pela reflexão ética e pela formação da moral. É neste contexto que o coordenador pedagógico e o diretor são fundamentais, pois se eles entenderem que os PCNs, no que tangem à ética, são uma boa proposta, então a proposta se torna coletiva, fazendo com que os demais funcionários da escola passem também a refletir sobre moral e ética, repensando sua postura e trabalhando para a formação de alunos “morais”.
E qual a responsabilidade dos pais na Educação de seus filhos?
Em vez de delegar autoridade, a maioria dos pais costuma delegar apenas responsabilidade à escola. Enquanto deveriam intervir para a melhoria da Educação como direito de todos, pensam apenas em seus filhos.
Extraído de
Jornal da Tarde
Opinião
10 de janeiro de 2.007
Mais um ano começa e o ensino público no Brasil ainda continua fraco. E o mais grave: falta reflexão - por parte da sociedade - sobre os princípios morais da escola e, principalmente, dos atores nela inseridos. Essa avaliação é de Yves de La Taille, especialista em psicologia moral da USP, que, em entrevista exclusiva ao JT, aponta possíveis caminhos para a melhoria da Educação básica do País.
JT: A escola pública brasileira é uma instituição justa?
Yves: As instituições são justas do ponto de vista das normas que elas regem. A escola pública tem de ser uma instituição justa, pois todo cidadão tem o direito a ela. O problema é que para que uma instituição seja de fato justa, é preciso que os representantes humanos desta instituição sejam morais. Por exemplo, professores que faltam o tempo todo acabam transformando a escola em uma instituição injusta.
Então a culpa da má qualidade do ensino público é do Estado ou do professor?
Primeiro, a escola pública é uma instituição do Estado. Se este estipula uma regra que autoriza o professor a faltar e que implica prejuízo claro para o aluno, então a lei por si só é injusta. No entanto, mesmo com as leis mais justas, é preciso que os seres humanos tenham uma atitude justa, respeitosa. Se o professor decide faltar o número máximo estipulado pelo Estado, ele mostra que não entendeu nada sobre o princípio da lei - que consiste em dar uma liberdade de faltas para casos de extrema necessidade. Então, este profissional acaba aplicando a regra e não o princípio da lei. Na verdade, uma pessoa moral apreende os princípios e não apenas as regras. Mas, por outro lado, reconheço que a profissão do professor é cansativa, principalmente para aqueles de escolas públicas que têm de acumular cargos para conseguir salário digno.
O que é ser uma pessoa moral?
A moral situa-se no campo do dever e refere-se à pergunta “como devo agir?”. A moral não depende de nada biológico. Todo ser humano nasce com uma tendência para a relação com seu semelhante. Se essa relação será violenta ou baseada na justiça, não é possível saber, pois isso não está programado. Então a moral é algo que se aprende.
E qual é o papel da escola na formação de um cidadão moral?
A moral está totalmente relacionada à área da Educação. O ser humano começa a desenvolver sua moral por volta dos quatro anos de idade, então, agentes externos - família e escola - são responsáveis pela formação da moral dessa criança. Mas o problema é que não há nada que obrigue o professor a levantar a discussão sobre moral e ética com os alunos, ou até mesmo com colegas de trabalho.
Mas a ética não é um eixo transversal proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)?
Os PCNs, que foram publicados há dez anos, propõem que a ética seja trabalhada de forma transversal, em equipe, o que significa que todos os professores são responsáveis pelo trabalho desta temática com seus alunos. Mas como é transversal, fica claro que isso não é atribuição de apenas um professor. O problema é que na prática geralmente vemos determinados professores fazendo trabalho brilhante com os eixos transversais, mas de forma isolada, sem a participação integrada dos demais professores, o que acaba traindo a própria idéia de transversalidade.
Então, o que fazer para que a escola pública ofereça ensino de qualidade e contribua de fato para a formação de cidadãos morais ?
Na constituição brasileira a Educação está claramente vinculada à formação de cidadania. A formação do cidadão passa necessariamente pela reflexão ética e pela formação da moral. É neste contexto que o coordenador pedagógico e o diretor são fundamentais, pois se eles entenderem que os PCNs, no que tangem à ética, são uma boa proposta, então a proposta se torna coletiva, fazendo com que os demais funcionários da escola passem também a refletir sobre moral e ética, repensando sua postura e trabalhando para a formação de alunos “morais”.
E qual a responsabilidade dos pais na Educação de seus filhos?
Em vez de delegar autoridade, a maioria dos pais costuma delegar apenas responsabilidade à escola. Enquanto deveriam intervir para a melhoria da Educação como direito de todos, pensam apenas em seus filhos.
Extraído de
Jornal da Tarde
Opinião
10 de janeiro de 2.007
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